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4 de out. de 2010

Liguem a TV: vamos estudar!



Novelas, seriados, desenhos animados, noticiários... Qualquer programa de televisão pode ser usado na sala de aula para introduzir ou aprofundar conteúdos e para discutir valores e comportamento


A professora Simone e os alunos da 4ª série da escola Egon Schaden, em Francisco Morato (SP): no final do projeto sobre trabalho infantil, a garotada interpreta apresentadores de telejornal e de comerciais, repórteres e cinegrafistas e aprende como a televisão é feita. Foto: Ricardo Benichio
A professora Simone e os alunos da 4ª série da escola Egon Schaden, em Francisco Morato (SP): no final do projeto sobre trabalho infantil, a garotada interpreta apresentadores de telejornal e de comerciais, repórteres e cinegrafistas e aprende como a televisão é feita. 
Ela usa ação, imagens e sons especialmente selecionados para prender a atenção da garotada. Ajuda na formação de memórias de longa duração. É capaz de desenvolver a imaginação dos jovens, e as histórias que ela conta são tema de conversas e debates acalorados entre eles. E tem mais: os alunos certamente permanecem de olhos grudados nela em tempo igual ou superior ao que ficam na escola. Dá para desprezar uma ferramenta pedagógica com essas características?

Estamos falando da televisão, esse meio de comunicação tão importante quanto controverso, que já despertou o amor e o ódio de muitos educadores, psicólogos e sociólogos. Alguns dizem que a TV aliena e emburrece. Outros a acusam de promover a violência e o consumismo. A programação que é veiculada nas dezenas de canais abertos ou por assinatura segue, sim, a lógica do entretenimento e do mercado: permanecem mais tempo em cartaz novelas, seriados, telejornais e outros gêneros que têm audiência, e, portanto, patrocinadores. Mas sua influência é inegável. Há dois anos, um estudo do Ateliê Aurora, programa de pós-graduação em educação da Universidade Federal de Santa Catarina, constatou que assistir televisão era a atividade mais marcante da rotina das crianças de todos os contextos sociais. Foram entrevistados alunos de Florianópolis de uma escola particular de elite e de escolas públicas localizadas em favela, no centro da cidade e em vila de pescadores. "A TV não é perfeita e o sistema educativo não vai mudá-la. Então, a escola deve usar esse recurso em benefício próprio", afirma Ismar de Oliveira, coordenador do Núcleo de Comunicação e Educação da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP).

Com a profusão de canais abertos e por assinatura, a televisão oferece programas para todas as faixas etárias. Noticiários, novelas, minisséries, seriados, talk shows, documentários, programas de auditório, desenhos animados, filmes, clipes... Eles podem ser usados para introduzir conteúdos, aprofundá-los ou ilustrá-los ou para debates sobre comportamento e ética. Selecione os que se encaixam em seus objetivos e fique de olho para perceber onde está o interesse da garotada.


 
Tudo na TV pode ser aproveitado



Não é nada fácil para os adultos que cresceram ouvindo críticas a esse meio de comunicação tratá-lo bem. Segundo Maria Thereza Fraga Rocco, professora da Faculdade de Educação da USP, há uma tendência por parte de pais e professores em olhar a telinha como o demônio responsável pelo (mau) comportamento das crianças: "Se ela fosse tão influente na atitude das pessoas, bastaria termos uma TV perfeita para vivermos na sociedade dos sonhos". Existem os programas violentos, os que veiculam valores distantes do que os educadores querem passar aos alunos e os que tratam a realidade de maneira simplista ou equivocada. Mas inclusive esses podem render bons frutos: "Tudo o que passa na televisão é educativo. Basta o professor fazer a intervenção certa e propiciar momentos de debate e reflexão", garante José Manuel Moran, professor das Faculdades Sumaré, em São Paulo, e pesquisador na área de tecnologias aplicadas à educação.

Portanto, abandone o discurso que rotula a telinha como a raiz de todos os males e procure assisti-la com outros olhos. Foi o que fez o coordenador pedagógico do Colégio Pentágono, em São Paulo. Carlos Nascimento Júnior precisava encontrar um assunto de interesse dos alunos de 5ª e 6ª séries para ser tema do jornal do colégio no ano passado: "Sempre achei a programação da televisão ruim e fútil e me recusava a perder o pouco tempo livre na frente dela. Mas percebi como esse meio de comunicação é importante na vida das crianças e resolvi dar mais atenção a ele".

Carlos notou a influência dos desenhos animados na fala e nas atitudes dos garotos e não teve dúvidas. Os jovens de 5ª e 6ª séries levantaram os desenhos preferidos pelos colegas da 4ª série, assistiram aos vídeos, discutiram a maneira como os personagens se relacionavam muitas vezes com brigas e violência e conceitos de justiça e amizade. Cada um escreveu um artigo para a publicação baseado nesses debates. Em um dos episódios, um erro científico: duas naves explodem no espaço produzindo barulho e fogo. "Como pode haver som no espaço se ele não se propaga no vácuo? (...) O fogo precisa de oxigênio para queimar, e no espaço não tem oxigênio", questionou Isabela Tavares em seu texto.



O melhor ela faz por você: prender a atenção 

No ano passado, pesquisa do Centro Brasileiro de Mídia para Crianças e Adolescentes (Midiativa), em São Paulo, constatou que a televisão começa a ter fortes concorrentes ao disputar a preciosa atenção de crianças e adolescentes. Internet e celular estão entrando com tudo como opção de lazer e divertimento, mas em camadas pequenas da população. Os jovens ainda gastam em média de quatro a cinco horas por dia na frente de um aparelho de televisão.

Elvira Souza Lima, pesquisadora na área de neurociências aplicada à mídia, de São Paulo, explica que a linguagem que a TV usa imagens em movimento, coloridas, trabalhadas com cortes e fusões e envolvidas em trilhas sonoras especialmente escolhidas mobiliza o sistema límbico, estrutura do cérebro responsável pelas emoções, o que leva a um estado de atenção concentrada. Alguns programas ainda desafiam a imaginação ao propor questões e não dar as respostas imediatamente. "A novela e as minisséries fazem isso muito bem, terminando os capítulos com suspense", exemplifica Elvira.



Olhar crítico vem com debates 

Com tantos recursos usados para emocionar e prender a atenção, será que a TV não pode se tornar mesmo um instrumento de manipulação de mentes? Sim, pode. Por isso, levar a televisão para a sala de aula implica também ensinar os alunos a vê-la com olhar crítico. Para Gilka Girardello, coordenadora do Ateliê Aurora, o fundamental é fazê-los entender que a televisão não é uma "janela para o mundo" como gostam de caracterizar os mais entusiasmados: "Ela é um recorte muito bem produzido e montado da realidade e não a realidade".

Estimular os alunos a opinar sobre os programas e chamar a atenção deles para os cortes das cenas e o uso da trilha sonora ajuda a criança a perceber as diversas possibilidades do meio. José Manuel Moran afirma que, quando os alunos produzem programas, captando imagens e selecionando cenas, fica mais fácil perceber as intenções de quem faz televisão. Mas, para tanto, a escola precisaria ter equipamentos. Se isso não for viável, um caminho é comparar os programas com outros produtos culturais: uma novela com o livro que a originou; o telejornal com o jornal impresso; o desenho animado com gibis.

Ao adotar a televisão como recurso pedagógico, convém avisar os pais eles podem ter preconceitos e achar que a escola está enrolando ao colocar a turma na frente do aparelho "em vez de" dar aula. Durante a conversa, Gilka Girardello aconselha o professor a enfatizar que os programas selecionados têm ligação com o conteúdo estudado. Algumas dinâmicas podem ser usadas, como a discussão sobre os valores morais e éticos que uma telenovela está veiculando e a análise de telejornais.



Como usar a TV em sala de aula 

Para que o uso produza resultados positivos na aprendizagem, antes de ligar o aparelho lembre-se de:

- Gravar o programa e selecionar as cenas que serão exibidas aos alunos, fazendo o recorte dentro dos seus objetivos.

- Planejar as aulas propondo exercícios e atividades relacionadas ao vídeo: eles não podem ser exibidos como se fossem auto-explicáveis.

- Checar a qualidade da imagem e do som.

- Parar a exibição sempre que necessário para comentários ou explicações.

- Pedir para os alunos anotarem as cenas mais importantes, as falas e os detalhes mais marcantes.

- Rever as cenas mais importantes.

- Observar as reações do grupo para voltar aos pontos da exibição que a turma mais se deteve. 
Como NÃO usar a telinha em aula

Sem critério e objetivos pedagógicos claros, a televisão pode virar embromação. Portanto, evite:

- Usar como tapa-buraco quando falta professor ou acontece algum contratempo.

- Passar vídeo que não tenha relação com o conteúdo: as crianças percebem que essa é uma forma de camuflar a falta de planejamento.

- Usar o recurso em todas as aulas e esquecer outras dinâmicas: o exagero diminui a eficiência e empobrece as atividades.

- Criticar sistematicamente possíveis defeitos de informação ou estéticos: se eles existirem, desafie a turma a encontrá-los e a questioná-los.

- Assistir à televisão com os alunos sem discussão: qualquer assunto que venha da televisão deve ser integrado com o tema da aula.


Noticiários atualizam os conteúdos escolares 

Uma das características da televisão é trabalhar com temas atuais. Dessa forma, ela pode atualizar conteúdos dos livros didáticos ou mesmo fornecer material que ainda não está neles. Simone de Godoy Cuchera, professora da Escola Municipal de Ensino Fundamental Egon Schaden, em Francisco Morato, município da Grande São Paulo, recorreu à TV para tratar de trabalho infantil com sua turma de 4ª série. O assunto foi um dos temas geradores do ano passado. A turma leu o Estatuto da Criança e do Adolescente e assistiu a reportagens dos programas Fantástico e Globo Repórter, da TV Globo.

Com as pesquisas na internet sobre as diferentes situações de trabalho infantil e o que está sendo feito no Brasil para erradicá-lo, os alunos perceberam que a realidade não se limita ao que é mostrado na telinha. Por outro lado, precisaram selecionar as informações para montar um "telejornal" sobre o tema, compreendendo a necessidade de síntese para o veículo. Os estudantes montaram cenários reproduzindo um estúdio de TV, um lixão e uma pedreira que usa mão-de-obra infantil. Meninos e meninas assumiram os papéis de crianças exploradas, apresentadores, repórteres e cinegrafistas. Alguns foram até garotos-propaganda dos produtos que criaram, como patiskate (patinete com skate), carlancheira e babylancheira (recipientes para a merenda), anunciados no intervalo.



Novelas e seriados rendem estudo de época e de costumes 

As novelas, minisséries, seriados ou episódios contam histórias do cotidiano. Ao abordar conflitos pessoais ou sociais comuns, prendem a atenção pela previsibilidade ou pelo humor. Essa relação entre o real e o imaginário atrai os telespectadores, que se identificam com situações ou personagens. A aproximação com a vida real fornece rico material para discutir valores e comportamentos.

Em um projeto sobre discriminação, uma das atividades sugeridas pela professora Maria da Glória Pereira de Miranda à sua turma de 8a série do Colégio Estadual Aurelino Leal, em Niterói (RJ), foi fazer o levantamento dos programas que mais apresentam situações de preconceitos racial, social ou de gênero. Os alunos pesquisaram em casa e concluíram que Chaves, seriado mexicano exibido à tarde pelo SBT, era o campeão. O personagem do título é maltratado pelos colegas por ser órfão, pobre e mal- vestido. Os estudantes começaram então a reparar como eles mesmos julgavam as pessoas pela aparência e, depois de um debate, concluíram que eles próprios são preconceituosos e que precisavam mudar de atitude.

Já as produções de época fornecem farto material de pesquisa em diversas disciplinas. As professoras Ana Néri de Oliveira Lins e Luciana Maria Silva Lopes, da 4ª série da escola Egon Schaden, em Francisco Morato, usaram a minissérie A Casa das Sete Mulheres, produzida pela TV Globo, para introduzir o estudo sobre a Região Sul. Elas compraram o DVD e a revista sobre o programa, assistiram em casa e selecionaram as cenas mais importantes para reproduzi-las em classe ao longo do projeto. O estudo rendeu vários capítulos: em História, os alunos pesquisaram a Revolução Farroupilha e os outros levantes ocorridos no Brasil Colônia; para fazer a maquete da residência, eles usaram conhecimentos de geometria e cálculos; em Artes, analisaram as imagens de Giuseppe e Anita Garibaldi e Bento Gonçalves publicadas nos livros com as dos atores que os interpretaram, fizeram retratos deles e reproduziram batalhas e cenas em desenhos; a comparação do vocabulário típico do gaúcho com o de outros estados rendeu divertidas aulas de Língua Portuguesa. Para finalizar, a releitura da minissérie deu origem a uma peça de teatro reescrita pela turma.

Noni Ostrower, coordenadora do Centro de Criação de Imagem Popular, no Rio de Janeiro, que oferece cursos de capacitação para diversas redes de ensino, sugere que as produções de época sejam exploradas na comparação de tecnologias, costumes, características sociais e econômicas com a sociedade atual. Quando se tratar de ficção, é possível estimular a imaginação da garotada pedindo à turma que escreva desfechos diferentes para as telenovelas ou seriados ou proponha outros começos para a trama. "O texto dos alunos ainda pode render uma versão em língua estrangeira", completa. 



Propaganda motiva estudo de Matemática


Keila Cilene Lopes de Oliveira, professora da Escola Estadual Jornalista Trajano Chacon, no Recife, encontrou na televisão uma aliada para motivar os jovens e adultos de 5ª a 8ª série. "Todos têm TV em casa, assistem e gostam." Para quebrar o grande tabu que a Matemática representava para eles, ela levou para a classe um vídeo com comerciais de supermercados e lojas de eletrodomésticos gravados em casa. Primeiro ela pediu para os estudantes relatarem o que viram e ouviram nas propagandas. O objetivo era que percebessem a força de coerção da linguagem. Depois ela introduziu os conteúdos: com os números utilizados nos comerciais, ela ensinou juros, desconto, vendas à vista e a prazo e propôs vários exercícios. "Eles se animaram ao constatar o uso prático da disciplina", contou a professora.

Para Ismar de Oliveira, o maior atrativo da telinha é ela ser puro entretenimento: "Ela trabalha com humor e síntese e conta histórias sem parar". E, bem trabalhada em sala de aula, pode ser o recurso que faltava para tornar as aulas mais dinâmicas e atraentes. 



fonte: http://revistaescola.abril.com.br

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